Justiça Federal no Paraná leva em consideração a perspectiva de gênero para garantir direito a benefício previdenciário
Uma decisão da Justiça Federal no Paraná tomou como parâmetro a perspectiva de gênero para conceder benefício previdenciário a uma mulher que se dedicava ao trabalho domésticos. O relator do caso, juiz José Antônio Savaris, proveu parcialmente o recurso apresentado por uma trabalhadora que, inicialmente, teve a solicitação de benefício indeferida pelo INSS, que considerou que ela havia realizado as contribuições de modo indevido, sem deter as condições de segurada.
“Penso que o primeiro aspecto que deve ser destacado para o caso em análise é o de que a relação jurídico-previdenciária posta em causa se relaciona específica e quase que exclusivamente às mulheres. E que por tal razão o julgamento deve se ocorrer na perspectiva de gênero”, afirmou o relator.
A interpretação do caso levou em consideração a vulnerabilidade social da parte e o modo como muitas mulheres brasileiras recorrem ao trabalho doméstico e informal em determinados momentos da vida. “Nesse contexto, é da realidade concreta que a mulher que trabalha sem remuneração no âmbito de sua residência, especialmente a pertencente à família de baixa renda, em sendo possível, em determinado momento de curso da vida, busque também um trabalho visível, externo e remunerado, ainda que de modo precário, informal, esporádico. Esse é o caso dos autos”, prosseguiu Savaris.
Em seu voto, o magistrado destacou um trecho do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, que aponta que é necessário estar “atento a como o direito pode se passar como neutro, mas, na realidade, perpetuar subordinações, por ser destacado do contexto vivido por grupos subordinados. E, a partir daí, interpretar o direito de maneira a neutralizar essas desigualdades”.
Com base nessa interpretação, a corte reconheceu a validade das contribuições previdenciárias para fins do direito ao benefício por incapacidade laboral.
A diretora da Jovem Advocacia da OAB Paraná, Fernanda Valério, que atua na área previdenciária, lembra que a Resolução nº 492 de 13/03/2023 do Conselho Nacional de Justiça estabeleceu diretrizes do protocolo aprovado pelo Grupo de Trabalho constituído na Portaria nº 27/2021, instituindo a obrigatoriedade de capacitação de magistrados e magistradas, relacionada a direitos humanos, gênero, raça e etnia, em perspectiva interseccional, e cria o Comitê de Acompanhamento e Capacitação sobre Julgamento com Perspectiva de Gênero no Poder Judiciário.
“A decisão comentada ainda comporta recurso, todavia, é significativo verificar a adoção do Protocolo de Perspectiva de Gênero na prática, principalmente em se tratando da esfera previdenciária, que ao longo do tempo e principalmente com a EC n º103/2019 delegou à legislação infraconstitucional persas matérias ligadas a proteção e previdência social”, conclui Fernanda.